MAM expõe a obra gráfica de Mira Schendel nos 30 anos de sua morte

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Séries importantes como ‘Toquinhos’ e “Frutas’ estão entre os trabalhos da mostra, que segue até abril no museu

Por Antonio Gonçalves Filho,
Publicado originalmente no O Estado de S. Paulo

O marchand Paulo Figueiredo, morto em 2006, foi um dos responsáveis pela ascensão da artista Mira Schendel (1919-1988). Ao fechar sua galeria, em 1995, doou ao Museu de Arte Moderna de São Paulo (em 1997) 130 obras de sua coleção. Entre elas estão monotipias, desenhos e objetos gráficos de Mira Schendel, homenageada nos 30 anos de sua morte com a exposição Signals/Sinais, na Sala Paulo Figueiredo do MAM, que tem curadoria do crítico Paulo Venâncio Filho.

Signals é o mesmo nome da galeria londrina que promoveu uma histórica exposição de Mira em 1967 e teve como curador o crítico Guy Brett, projetando o nome da artista na Europa – foi por essa época que ela conheceu o filósofo Max Bense (1910-1990). Ele viria a assinar textos de catálogos de suas exposições na Alemanha. Foi um ano depois da mostra inglesa, em 1968, que Mira começou a produzir a série Toquinhos, peças de acrílico transparente nas quais ela aplicava letras, signos gráficos ou pedaços de papel japonês tingido com ecoline.

MAM expõe a obra gráfica de Mira Schendel nos 30 anos de sua morte

Sob o signo da filosofia: obra marcada pelo conceito Foto: Rômulo Fialdini/MAM

A série é um dos principais destaques da mostra – que não é uma retrospectiva, esclarece o curador. “A ideia da exposição foi a de reunir trabalhos com predominância dos elementos comuns à obra gráfica de Mira, como os traços, as letras, as frases e os signos”, diz o curador, que instalou uma centena desses trabalhos no MAM.

Além dos “toquinhos” estão na mostra os objetos gráficos (produzidos de 1967 em diante) e as monotipias da artista suíça naturalizada brasileira. As monotipias, segundo a concepção do curador, são os trabalhos mais reveladores da personalidade da artista. E ela fez centenas delas. “As monotipias dizem muito sobre o caráter de Mira”, justifica. “Elas são inclassificáveis, pois têm elementos construtivos e ao mesmo tempo não abdicam da expressão, um pouco como a personalidade da artista, que era também uma intelectual”, conclui.

De fato, os interlocutores de Mira justificam a observação. Além de Max Bense, Anatol Rosenfeld fez parte do triunvirato de pensadores com os quais dialogou. O terceiro foi o filósofo alemão Hermann Schmitz, que conheceu nos anos 1970 e se tornou sua principal referência no campo da fenomenologia, adotando conceitos como o da individuação a partir do múltiplo caótico, presentes na obra do pensador.

MAM expõe obras gráficas de Mira Schendel nos 30 anos de sua morte

Imagem da série ‘Frutas’, de Mira Schendel, uma das que integram a exposição Foto: Museu de Arte Moderna

A despeito dessa proximidade com a filosofia, Mira insistia que não produziu uma obra exclusivamente cerebral, mas visual. De fato, o que se vê na sala Paulo Figueiredo do MAM é um a obra de simplicidade desconcertante, até mesmo despojada, que, no entanto, leva o espectador a superar os dualismos e se deixar levar pela beleza das composições.

“Toda essa extensão alcançada com os mais simples meios gráficos constitui uma estrutura sígnica variável, aberta, inconstante, flexível, em contínua e infinita expansão”, define o curador, aproximando esses sinais gráficos de Mira de uma tabela periódica que, por meio de uma disposição sistemática de traços, letras e rabiscos, conduzem a uma espécie de revelação epifânica, mesmo que eles sejam apenas esquemas.

A esse respeito, o crítico Alberto Tassinari observou, a respeito de uma série chamada Frutas (representada na mostra), que esses desenhos ficam a meio caminho entre a figuração e abstração. Não são exatamente frutas, mas esquemas de frutas, escreveu Tassinari.

Entre outros “esquemas” é possível identificar em dois desenhos da exposição esboços daquela que viria a ser sua obra maior, a série Sarrafos (1987), exibida em sua última mostra e feita em gesso e têmpera sobre madeira, quebrando a fronteira entre a pintura e a escultura.

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