David Hockney | Artista do Mês | Abril de 2019

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Conhecido por suas colagens de fotos e pinturas de piscinas de Los Angeles, David Hockney é considerado um dos artistas britânicos mais influentes do século XX

As brilhantes piscinas de David Hockney, os sobrados e as paisagens californianas suburbanas são uma mistura estranha de calma e hiperatividade. Sombras parecem ter sido banidas de suas telas de acrílico dos anos 1960, escorregadias como páginas de revistas. Planos achatados se apresentam lado-a-lado como em uma colcha de retalhos, confundindo nosso senso de distância.

O estilo inconfundível de Hockney incorpora uma ampla gama de fontes, do barroco ao cubismo e, mais recentemente, a computação gráfica. Um iconoclasta obcecado pelos velhos mestres, esse artista pop britânico rompe deliberadamente todas as regras, deliciando-se com a desconstrução da proporção, da perspectiva linear e da teoria das cores. Ele mostra que as ortodoxias devem ser destruídas e que os opostos podem coexistir, uma mensagem de tolerância que transcende a arte e tem implicações profundas no campo político e social.

Em novembro de 2018, sua obra “Portrait of an Artist (Pool with Two Figures)”, de 1972, foi vendida pela Christie’s em Nova York por US $ 90 milhões, tornando-se o trabalho mais caro de um artista vivo vendido em leilão. A venda quebrou o recorde anterior, estabelecido em 2013 por Balloon Dog (Orange), de Jeff Koons, arrematado por US$ 58,4 milhões.

Portrait of an Artist (Pool with Two Figures), 1972

Portrait of an Artist (Pool with Two Figures), 1972

Ideias-chave

Como outros artistas pop, Hockney reviveu a pintura figurativa em um estilo que referenciava a linguagem visual da publicidade. O que o separa dos demais no movimento pop é sua obsessão com o cubismo. Com este espírito, o artista combina várias cenas para criar uma visão composta, escolhendo espaços complicados, como casas de dois andares na Califórnia e no Grand Canyon, onde a percepção de profundidade já é um desafio.

Hockney insiste em temas pessoais – outra coisa que o separa da maioria dos outros artistas pop. Ele descreve a esfera doméstica – cenas de sua própria vida e de amigos. Isso o alinha com Alice Neel, Alex Katz e outras pessoas que descreveram seu entorno imediato de uma maneira que transcende uma determinada categoria ou movimento.

Abertamente homossexual, manteve-se como firme defensor da causa. No contexto de um cenário machista da arte, que descartou a “cor bonita” como efeminada, os verdes brilhantes, roxos, rosas e amarelos de Hockney são declarações em apoio à liberdade sexual.

Ao procurar imitar ativamente efeitos fotográficos em seu trabalho, o artista é um precursor dos fotorrealistas. Ele também é um herege entre os puristas que acham que a pintura deve se basear apenas nas observações diretas da natureza por parte do artista.

Embora não seja universalmente aceita, a pesquisa de Hockney sobre a história da arte mostrou que grandes mestres, de Vermeer a Canaletto, frequentemente usava a câmera obscura (uma forma inicial de câmera) para melhorar seus efeitos ópticos. Ele insinua: “Se os venerados mestres antigos puderam usar câmeras, por que não podemos?”.

Infância

David Hockney nasceu em uma família da classe trabalhadora em Yorkshire, norte da Inglaterra, na cidade industrial de Bradford. Seu pai “achava que deveria haver justiça no mundo”, lembra Hockney. Ele também romantizou os ideais do partido comunista na Rússia. Ao adotar a postura anti-guerra de seu pai, Hockney permaneceu resistente a ideologias e hierarquias.

Como estudante, Hockney diz de si mesmo: “Eu sempre fui muito sério, mas atrevido”. Arte era algo que ele sabia que queria fazer muito cedo na vida. Em sua escola, academicamente promissor, os meninos eram forçados a abandonar a arte como assunto e, por isso, ele deliberadamente falhou em seus exames.

David Hockney, Views of Hotel Well I 1984–5

David Hockney, Views of Hotel Well I 1984–5

Primeiros passos

Aos 16 anos, Hockney foi admitido na aclamada Escola de Artes de Bradford, onde estudou pintura tradicional e desenho ao lado de Norman Stevens, David Oxtoby e John Loker. Ao contrário da maioria de seus colegas, Hockney trabalhava incansavelmente, especialmente nas aulas de desenho, lembrando: “Eu estava lá das nove da manhã às nove da noite”.

Em 1957, ele foi convocado para o Serviço Nacional, mas como objetor de consciência ele serviu em um hospital em ordem. Foi nessa época que Hockney encontrou o trabalho do empresário de balé russo Sergei Diaghilev, cuja abertura sobre sua identidade sexual deu a Hockney a coragem de revelar a sua.

Em 1959, Hockney passou a estudar no Royal College of Art, em Londres, e foi ensinado por vários artistas conhecidos, incluindo Roger de Gray e Ceri Richards. Seus amigos incluíam R.B. Kitaj, Allen Jones e Peter Blake. Na época, o colégio pedia aos alunos que enviassem uma redação junto com o trabalho final. Hockney recusou, querendo ser julgado apenas com base em sua arte. Notavelmente, a RCA, um bastião da tradição, mudou suas regras para permitir que ele se formasse.

A Bigger Splash, 1967

A Bigger Splash, 1967

Maturidade

A primeira exposição individual de Hockney, realizada em 1963 na galeria de John Kasmin, foi muito bem sucedida. No ano seguinte, ele viajou para Los Angeles, onde conheceu figuras intelectuais e artísticas importantes, incluindo Christopher Isherwood e o designer Ossie Clarke, com quem estabeleceu uma estreita amizade. Mais tarde ele seria o padrinho do casamento de Clarke com Celia Birtwell, de quem ele pintaria e desenharia muitos retratos. Nos anos seguintes, residiu quase permanentemente na Califórnia, lecionando em várias universidades, incluindo Berkeley e UCLA, mas também viajando extensivamente pelos EUA e Europa. Durante este período, ele pintou algumas de suas obras mais conhecidas, incluindo A Bigger Splash (1967). Ele também começou a projetar produções para balé, ópera e teatro.

Na Califórnia, durante a década de 1960, Hockney abraçou o clima de experimentação, exploração e iconoclastia. Numa época em que a homossexualidade ainda era ilegal nos EUA e na Grã-Bretanha, os casos amorosos abertos de Hockney e sua atitude sem culpa atraíram a atenção de jornais e revistas. Ele conheceu Peter Schlesinger, com quem iniciou um relacionamento de longo prazo e que seria seu modelo frequente, entre 1966 a 1971. De seu estilo de vida não convencional e experimentação com drogas durante este período, Hockney comentou: “Você não pode ter uma boemia livre de drogas. Você não pode ter uma boemia sem bebida”. Em 1973, Hockney mudou-se para Paris, onde viveu até 1975. Em meados da década de 1970, ele já era bastante famoso. Em 1974, viu uma grande retrospectiva itinerante de seu trabalho e um filme sobre ele dirigido por Jack Hazan. Em 1976, Hockney publicou sua autobiografia e, em 1978, estabeleceu-se em Los Angeles, que se tornou seu lar permanente.

A crise da AIDS na década de 1980 mudou o mundo da arte para sempre e teve um impacto particularmente profundo em Hockney, que lembra “a primeira pessoa a morrer de AIDS que eu conhecia foi em 1983 e, então, durante dez anos foi muita gente. Se todas essas pessoas ainda estivessem aqui, acho que seria um lugar diferente”.

A Closer Grand Canyon, 1998

A Closer Grand Canyon, 1998

Últimos anos

A década de 1990 foi um período muito produtivo para Hockney, com um grande número de retrospectivas e exposições em todo o mundo. Em 1991, ele começou um relacionamento com John Fitzherbert, um ex-chef, que durou os próximos 25 anos. Uma de suas obras mais importantes em grande escala, A Closer Grand Canyon, foi concluída em 1998.

De 2000 a 2001, ele pesquisou e escreveu um livro sobre os grandes mestres da história da arte, desenvolvendo uma teoria de que esses artistas usavam a câmera muito antes do que anteriormente pensado. Para sua pesquisa, Hockney montou fotocópias de pinturas dos velhos mestres, desde a arte bizantina até Van Gogh, em uma parede enorme em seu estúdio em Los Angeles. Embora a teoria de Hockney tenha encontrado resistência significativa, ela ganhou amplo apoio da comunidade de história da arte.

Em 2002, Hockney mudou-se para a cidade litorânea de Yorkshire, Bridlington. No mesmo ano, ele posou por 120 horas para um retrato pintado por Lucian Freud. Em troca, Freud sentou-se por quatro horas para ele.

Hockney teve um derrame em 2012, o que por um tempo prejudicou seu discurso. Para seu grande alívio, “o derrame não afetou meu desenho e essa é a coisa mais importante”. Apenas alguns meses depois, um de seus assistentes, Dominic Elliot, morreu na casa de Hockney. Ele havia tomado cocaína e ecstasy e bebido uma garrafa de limpador de ralo. Elliot estava em um relacionamento com o ex-parceiro de Hockney, John Fitzherbert, que ainda morava com ele. No inquérito, Hockney foi obrigado a dar provas de que a morte não foi um assassinato.

Legado

Em 2011, uma pesquisa com um grupo de 1000 artistas britânicos classificou Hockney como o artista mais influente de todos os tempos. Sua obra desempenhou um papel crucial no relançamento da prática da pintura figurativa. Chuck Close, Cecily Brown e o diretor de cinema Martin Scorsese (em especial, a estética de Taxi Driver, em 1976) estão entre os artistas inspirados por Hockney.

A artista, ainda prolífico, continua a se reinventar, abraçando a tecnologia contemporânea. Sua mais recente série de trabalhos foi produzida em um iPad. Apesar de sua fama generalizada, ele continua sendo um iconoclasta, recusando-se firmemente a aceitar a autoridade institucional, mesmo algumas das mais altas honras, recusando um convite para pintar um retrato da Rainha (Hockney estava “muito ocupado” e não conseguiu) e a Ordem do Mérito (como cavaleiro). “Eu não tenho fortes sentimentos sobre o sistema de honras”, observou Hockney, “eu não valorizo prêmios de qualquer espécie. Eu valorizo meus amigos.”

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